Consulesa francesa visita Terreiro de Candomblé e mostra que tem samba no pé

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Itapecerica da Serra/SP – Nem o passaporte diplomático livra Alexandra Baldeh Loras das mazelas do racismo. “Sempre me param na alfândega. Acham que sou uma ‘mula’ [pessoa que faz o transporte de drogas], uma traficante de drogas”, contou a jornalista francesa que chegou à capital paulista, há pouco mais de três anos, na posição de mulher do cônsul-geral Damien Loras, que esteve dia 12/12 no Nzo Tumbansi, terreiro de candomblé de tradição congo angola, em Itapecerica da Serra, região metropolitana da Grande São Paulo.

IMG-20151212-WA0069Kota Kitamazi N’ganga, a médica Eunice Bernardes
entrega para Alexandra Baldeh Loras título de
Grande Benemérita da Cultura Afro-Bantu
concedido pelo Ilabantu.

Nesse tempo, Alexandra já sofreu quase todo o tipo de preconceito que as brasileiras negras e pobres sofrem diariamente. “Em eventos [do consulado] que recepciono, muitos convidados não se dão conta de que sou a consulesa. Mesmo depois que pego o microfone para falar algo, não percebem que era eu a pessoa pela qual passaram sem dar atenção na entrada”, contou a descendente de africano da Gâmbia em sua fala no Terreiro, espaço que pisou pela primeira vez e ficou encantada por ter sido convidada para pisar pela primeira vez em uma Comunidade Tradicional de Matriz Africana.

IMG-20151212-WA0091Taata Nkisi Katuvanjesi, Jornalista Walmir Damasceno
e Consulesa Alexandra Baldeh Loras

“O mesmo acontece em hotéis de luxo, que só me tratam bem depois de ouvirem o meu sotaque, ou quando estou no clube com meu filho, quando perguntam o porquê de eu não estar de branco [traje obrigatório em vários lugares para babás]”, acrescenta. O espanto cresce ainda mais quando esse público elitizado a vê ao lado do marido. “Acham que eu só poderia ser casada com alguma pessoa mais velha, me ligando a algum tipo de oportunista, e não com o Damien, que é lindo”.

IMG-20151212-WA0080Mam`etu Sinderewi, Iara Damasceno entrega para a
Consulesa um quadro do artista angolano Isidro Sanene

Em uma tarde de sábado chuvosa, diversas lideranças de povos e comunidades tradicionais de matriz africana lotaram as dependências do Ilabantu/Nzo Tumbansi. Taata Katuvanjesi recepcionou com maestria e presteza a representante do governo francês, Taata Taua, presidente da Cobantu entoou cânticos e saudações aos ancestrais bantu e homenageou a visitante. Íyà Carmem de Oxum (Ilê Olá), Ìyà Iraildes de Ogún, líder do PUPTMA – Pela União dos Povos de Matriz Africana, representou os povos de tradição yorubá juntamente com Ìyà Maria Isabel, entre outros.

IMG-20151212-WA0104Consulesa Alexandra Baldeh Loras fala ao presentes

Aos quase 40 anos, a consulesa é uma das mais jovens ativistas da causa negra. Nos últimos meses, fez participações em importantes programas de televisão brasileiros e chamou a atenção pela polêmica e astúcia ao lidar com um público muitas vezes avesso às suas ideias. A mesa em que fez parte no Nzo Tumbansi foi integrada por membros do Terreiro e entre eles destaca-se a professora mestra em história africana e afro brasileira, Patricia Cerqueira do Santos, ex-secretária municipal de cultura de Itapecerica de Serra; professor doutor em sociologia pela UFSCar, Deivison Nkosi, diretor de pesquisas e projetos do Ilabantu; Kota Kitamazi N’ganga, a médica Eunice Bernardes, secretaria executiva da Instituição; professora Adriana Vasconcelos e outros.

IMG-20151212-WA0050O público lotou o espaço e acompanhou atento o evento

Além da política antirracista empreendida pelo Ilabantu/Nzo Tumbansi, que busca combater toda forma de discriminação e intolerância correlata e a revalorização do patrimônio cultural africano e afro brasileiro, principalmente em se tratando da cultura bantu, o projeto idealizado por Taata Katuvanjesi – Walmir Damasceno, visa o fortalecimento político dos povos e comunidades tradicionais de matriz africana.

IMG-20151212-WA0051Ngoma do Nzo Tumbansi entoou cânticos tradicionais para saudar
a presença da Consulesa

Em uma das aparições, indagada sobre se concordava com a política de cotas nas universidades, Alexandra respondeu negativamente e foi imediatamente aplaudida com furor pelo público presente, inclusive pelo próprio entrevistador, Jô Soares. Mas o interessante foi o complemento da resposta. Quando a consulesa disse em meio aos aplausos “mas é a única solução” – chamando a atenção para os 127 anos pós-abolição sem êxito em diversos aspectos – um silêncio absoluto pairou sobre as mesmas pessoas. “É uma das maneiras como eu consigo colocar o assunto. Se você pega uma plateia como aquela, você não pode já dizer o que pensa porque a discussão se fecha”.

IMG-20151212-WA0052Afoxé Filhos de Ganga Zumba, de Cubatão/SP,
se apresentando no Nzo Tumbansi

O discurso de Alexandra é recheado de números e percentuais, fruto de quem já passou por mais de 50 países e abraçou a causa do preconceito nas redes sociais e na vida pessoal. Ela sabe que o Brasil tem 57% da população formada de pretos e pardos (segundo o IBGE), que 85% das crianças negras apontam a boneca negra como a “má” e que os negros são responsáveis pelo consumo de mais US$ 49 bilhões no País. A consulesa, que considera a leitura do livro “As minhas estrelas negras”, de Lilian Thuram, um resgate da sua própria autoestima, usa então da sua própria experiência para dizer que o negro no Brasil precisa ser sacado do clichê ainda presente da dupla futebol-samba.

IMG-20151212-WA0053Taata Taua, Iya Carmem D’ Osun, Iya Iraildes D’ Ógùn e lideranças

Ao final do encontro no Ilabantu/Nzo Tumbansi, a consulesa francesa foi homenageada pelo Afoxé Filhos de Ganga Zumba, de Cubatão/SP, momento em que Alexandra Loras impressionou a todos e chamou atenção dos presentes e mostrou que também tem o samba no pé.

Dia 17/12, a Consulesa Alexandra Loras, recebeu em audiência privada na Residência Consular, no Jardim Europa, bairro de classe alta da capital paulista, o Taata Katuvanjesi – Walmir Damasceno, momento em que conversaram por quase três horas e trocaram impressões sobre as lutas empreendidas por ambos.