6ª Conversa de Terreiro discutirá “O Tempo e a Ancestralidade: os desafios da dinâmica de uma nova época”

São Paulo – Sexta conversa de Terreiro será realizada no Terreiro de Candomblé de Santa Barbara, evento acontece no dia 18 de setembro próximo, das 9 às 18h00 com os temas “O Tempo e a Ancestralidade: Os desafios da dinâmica de um nova época.”

sexta_conversa_terreiroFotógrafo e jornalista Pierre Michel Jean, do Haiti, acompanhado da
Maganza Ndembwemin, doutoranda da PUC Liliane Braga, de Matamba;
arqueóloga Paty Marinho; Makota Maza dia Nzambi, Tata Kambandu Loketala

Pela primeira vez desde que foi idealizada, o projeto “Conversa de Terreiro” realizado pelo ILABANTU acontecerá fora do espaço físico do Inzo Tumbansi. No próximo dia 18 de setembro, um domingo a tradicional roda de conversa que objetiva reunir seguidores da umbanda e candomblé, o chamado “povo-de-santo” e a sociedade em geral, o encontro acontecerá no Terreiro de Candomblé de Santa Barbara, no bairro de Vila Brasilândia, zona norte da capital paulista.

Fundado por Mãe Manaundê, responsável pela disseminação da tradição angola em São Paulo, o terreiro encontra-se em processo de tombamento como patrimônio imaterial pelo CONDEPHAT e IPHAN.

Graças a luta política empreendida pelo Ilabantu junto ao mandato do vereador paulistanoToninho Véspoli (PSOL), o logradouro público onde está estabelecido o terreiro encontra-se em fase de mudança de nome de Rua Ruiva para Rua Manaundê. Um projeto de lei foi proposto pelo vereador para homenagear a fundadora do terreiro, dirigido atualmente por Nengwa Oyajide, mãe Pulqueria Albuquerque, de Uambulu N`sema (Bamburucema).

Para discutir o tema proposto, estarão reunidos o antropólogo Pedro Neto; o professor doutor Vagner Gonçalves (USP); Makota Maiangansi (Veridiana Machado, mestra em psicologia pela USP-Ribeirão Preto), membro do Terreiro Tumbansé – Salvador-Bahia); Ndembwemi diá Nzambi (Liliane Braga), Maganza de Uambulu N´sema(Bamburucema), doutoranda em História pela PUC-SP, educadora e pesquisadora do CECAFRO (Centro de Estudo Culturais Africanos e da Diáspora, da PUC-SP), e Deivison Nkosi, cientista social, professor da UNIFESP e membro do Grupo Kilombagem.

A realização da Conversa de Terreiro na Vila Brasilândia é também uma ação afirmativa, uma que se trata de bairro com maior contingente de negros, na capital paulista, segundo pesquisa do Núcleo de Consciência Negra da USP.

A relação da cultura e os caminhos que esta percorre

“Sou de uma religião em que o tempo é ancestralidade. A fruta só dá no seu tempo, a folha só cai na hora certa”, assim, repetindo a fala da celebre ìyàlòórìsà baiana-carióca Beatriz Moreira Costa – Mãe Beata de Iemanjá, Tata Katuvanjesi – Walmir Damasceno, árduo defensor de implementação de políticas públicas inclusivas para povos de terreiros e luta por garantias de direitos e respeito para as religiões de matriz africana, decidiu realizar esta “Conversa de Terreiro” fora do espaço de nascimento do evento e alocar nas dependências do tradicional Terreiro de Candomblé de Santa Bárbara, local que marca a presença das tradições africanas na maior capital econômica da América latina.

Com os avanços tecnológicos, a criação da internet e o uso das mídias sociais temos a impressão que o tempo se tornou mais veloz e isso reflete em todo o comportamento da sociedade, já não queremos mais esperar nem a chegada de uma carta, pois com um simples toque no celular estamos em contato com diversas pessoas e em frente a um computador temos acesso a uma infinidade de informações e possibilidades que há 10 anos atrás seriam impensáveis. Caminhamos para o imediatismo!

O mundo evoluiu e a sua dinâmica também, por isso temos que pensar como essas mudanças em relação ao tempo afeta nós de tradição de matriz africana, pois temos nossos cultos baseados na ancestralidade e a tradição que essa nos deixou, tradição essa onde tudo tem seu tempo e esse tempo não é o tempo de hoje e sim do que já passou.

A relação da cultura de matriz africana em solo brasileiro se dá pelas associações bem sucedidas deste povo com a sua ancestralidade, base de todo o culto herdado da Matriz. A cultura se baseia intricadamente pelas manifestações religiosas e de herança. E neste sentido temos a necessidade de reconhecer a soberania do antigo, do anterior, do ortodoxo.

Os caminhos que esta cultura percorre até se tornar autóctone em terras brasileiras no que chamamos de cultura negra nacional, e religiosamente de “Candomblé” nas suas mais diversas vertentes, apoiam-se no corpo, que não necessariamente é o corpo físico, mas suas representações mais diversas. Seja o corpo social, seja o corpo memorial, seja o corpo geográfico e suas lembranças. Portanto, as histórias, mitos e lendas se faz a base de toda a formação cultural desta saga.

Nas Américas, na época da escravidão, os povos escravizados tentavam se comunicar com os ancestrais enterrados na África. Em épocas de guerra, famílias de várias partes do mundo vendiam todas as posses que tinham para recuperar os corpos de parentes mortos.

Os ensinamentos ancestrais africanos devem estar na base epistemológica de todo e qualquer pesquisador que pretenda estudar a história e a cultura afro-brasileira. Pois, como afirma Oliveira, “A ancestralidade é como um tecido produzido no tear africano: na trama do tear está o horizonte do espaço; na urdidura do tecido está o tempo. Entrelaçando os fios do tempo e do espaço cria-se o tecido do mundo que articula a trama e a urdidura da existência” (2007, 6). A territorialidade pode ser percebida como espaço de práticas culturais nas quais se criam mecanismos indenitários de representação a partir da memória coletiva, das suas singularidades culturais e paisagens.

Acreditamos na grandeza da vida, em que “o elemento terra é responsável por nosso sentido de identidade, nosso pé no chão e nossa habilidade de apoiar e nutrir uns aos outros” (Somé, 2003). Acreditamos que “Tudo que move é sagrado”, como são sagrados todos os seres da terra: as pedras, o céu, a terra, as flores, o vento, a água, o ar e o fogo. Nesse sentido, cabe a nós pesquisadores negros/as romper com o dogmatismo da luta de classe. “É preciso saber resistir ao que é superficialmente claro imediatamente compreensível porque totalmente racional” (Maffesoli, 2001). “A territorialidade seria assim resultante de uma unidade construída, em detrimento das diferenças internas, porém evocando sempre a distinção em relação às outras territorialidades”. (SECAD).

O tempo transige de forma contumaz estes códigos no momento em que os signos originais são perdidos pelas singularidades do momento. E cabe aos agentes destas culturas originais, bem como aos sacerdotes a missão de manter acesa a chama da ortodoxia. Povos de terreiros traz um verbete sem tradução direta, “Kuku-Lailai”, ou seja, muito, muito antigo. A partir daí compreendemos que o tempo não pode infringir regras solidificadas pela ancestralidade, pela raiz. Não tem o direito de adaptar ensinamentos originais para situá-los às sociedades contemporâneas.

Não que o objetivo seja o de retomar ritos da matriz. Mesmo porque sabemos ser o candomblé uma religião autóctone, brasileira por essência. Mas as divindades não são brasileiras. Entretanto o modo de cultuá-las não pode ser adaptado. A liturgia sagrada das divindades deve obrigatoriamente seguir os parâmetros originais. Sob o risco desta divindade Elemental e antiga não reconhecer o culto e não responder ao chamamento sacerdotal.

Texto de Taata Tawalewesy – França de Kabila; e Maganza Ndembwmin, Liliane Braga, da redação da Kimwanga-Nsangu (Agência de Notícias), ILABANTU/Nzo Tumbansi.

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