Taata Katuvanjesi faz giro histórico pela Bahia

O IV SIALA

Educadores, Professores Doutores, Historiadores, Lideres Religiosos de comunidades tradicionais de terreiros participaram do IV SIALA – Seminário Internacional de Línguas Africanas: Africanias, Imagens e Linguagens, realizados na Universidade do Estado da Bahia, na cidade de Salvador durante os dias 28, 29, 30 e 31 de agosto. O Seminário teve como objetivos aprofundar as discussões sobre a diversidade étnica, discutir a influência da África no Brasil através de imagens e linguagens, e ainda, ressaltar a importância dos indivíduos de origem ou descendência africana na construção do nosso país.

A ABERTURA

A abertura do evento foi presidida pelo reitor da Universidade do Estado da Bahia, Lourisvaldo Valentim da Silva, em uma iniciativa do Núcleo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros em Línguas e Culturas – NGEALC e do Centro de Pesquisa em Educação e Desenvolvimento Regional, e aconteceu na sede da Empresa Odebrecht, no edifício Odebrecht, na avenida Paralela.

No dia 29 de agosto a reabertura do evento aconteceu no Teatro da UNEB e foi marcada pela apresentação do Musicólogo Paraná Bonfim e os Filhos do Congo. Os homenageados foram Jorge Amado, pelo seu centenário, e a Iyalorixá Margarida de Xangô, do Terreiro do Cobre/Salvador. Em seguida foi exibido o documentário: O Povo Khoisan: História, Língua e Cultura, apresentado e comentado pelo Antropólogo do Museu de Antropologia de Luanda, Américo Kuononoka. Segundo ele, o povo Koshian que vive em Angola é um dos poucos que ainda preserva sua língua-mãe.

Infelizmente esta população diminui a cada dia, muito em função da discriminação dos próprios angolanos. Na segunda etapa o Cineasta Joel Zito Araújo apresentou o documentário, produzido por ele, A negação do Brasil, que retrata a exclusão dos negros na televisão brasileira. A Mesa Redonda sobre Literatura Baiana e Afro-brasileira, realizada no segundo dia, fez uma conexão com as diversas literaturas de origem africana e afro-brasileira. Foram o foco do terceiro dia, as religiões afro-brasileiras e suas relações com os acervos culturais. Anselmo José da Gama Santos (Tata do Terreiro Mokambo Salvador/BA), Iraildes Santos (Ilê Axé Opô Afonjá Salvador – BA) e Mille Caroline Rodrigues Fernandes, PRODESE / UNEB participaram da conferência.

Durante as tardes foram realizados diversos mini cursos com temáticas específicas. As historiadoras optaram pelo mini curso O Poder Tradicional em África – A rainha Jinga – A rainha quilombola, ministrado pelo Antropólogo e Professor da Universidade de São Paulo Carlos Serrano. O Professor esclareceu como se davam as organizações políticas dos reinos de Angola nos séculos XVIII e XIX e de que maneira ocorriam as sucessões de chefia política. A Rainha Jinga destacou-se neste contexto, onde somente homens governavam, devido à sua autoridade e as relações estreitas com os escravistas.
Esta atividade foi de grande valia para os historiadores, que estão cursando especialização em História da África e Afro-brasileira, e os conhecimentos adquiridos poderão ser aplicados nas atividades educativas e culturais relacionadas à história e tradições africanas desenvolvidas nas comunidades.

No dia 31, foi à vez do Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi apresentar a sua contribuição aos participantes do evento. Com o tema Religiosidade e Saberes Tradicionais`, antes mesmo da sua apresentação o líder do Inzo Tumbansi Tua Nzaambi Ngana Kavungu – Terreiro de Candomblé de Tradição Congo-Angola, localizado em Itapecerica da Serra, região metropolitana sul da Grande São Paulo, traçou um panorama de como é ser de candomblé e praticar suas crenças tradicionais em uma megalópole como São Paulo.

São Paulo, a polis monstruosa, o imenso sistema de aparente caos, São Paulo em sua imensa escama urbana, pois é uma cidade que se refaz continuamente, como as serpentes que trocam de pele, abriga em suas reentrâncias a diversidade e os pares de oposição que estruturam o seu imenso sistema. Ou seja, de um lado o percentual populacional dos que historicamente mantém os seus privilégios: donos de empresas, industriais, políticos, profissionais prestigiados, artistas da indústria cultural entre outros. Do outro lado, por trás da cortina de fumaça, o conjunto dos que são postos de lado em uma perspectiva socioeconômica, em suma os que são minimizados em um espectro cultural dominante: a população negra em sua maioria, os imigrantes oriundos do nordeste brasileiro, todos esses que são tornados a grande massa explorada de trabalhadores e também no imenso exército de reserva de produção do sistema capitalista, os excluídos das esferas formais de emprego.

São Paulo é um organismo que em seu interior pulsam micro sistemas e contradições não passiveis de serem assimiladas pela esfera dominante. Vale citar o crime organizado que em última análise é um reflexo da desigualdade sustentada sistematicamente. Todavia, existem outras contradições que empregam o enfrentamento em outros campos de atuação, como as culturas tradicionais que resistem e se fortalecem inesperadamente em um ambiente de acentuado apelo à mercantilização de todo o existente, nesse processo de acelerada globalização que tenta nivelar toda a diferença torná-la assimilável e homogeneizada à visão de mundo dominante.

O terreiro de tradição congo- angola, Nzo Tumbansi, localizado em Itapecerica da Serra, região metropolitana sul da megalópole paulista é um dos exemplos de grupos que resistem e se refazem em um ambiente muitas vezes hostil como uma selva, mas uma selva de flora artificial e cruel fauna humana. Nesse espaço, a visão de mundo de raiz bantu questiona, dialoga, com um modo de ser secularizado de uma metrópole que não conhece em suas bases formais o respeito sagrado à sua biodiversidade é o caso de seus rios estéreis, irremediavelmente poluídos, fluxos patogênicos e fétidos.
Dentro dessas dinâmicas dessacralizadas, que se estabelecem nos espaços urbanos, também o tempo sofre modificações perceptivas, tudo parece se acelerar, a velocidade do efêmero se acentua, no entanto, se aquieta, assume outra feição nos espaços dos terreiros onde o tempo é sempre reencontro, com o passado, com os mais velhos e com os ancestrais. Nos terreiros o tempo necessariamente retorna a uma dimensão mítica onde ele, o tempo, também se torna divindade.

Porém, os terreiros de candomblé na modernidade e, sobretudo, nas dimensões paulistas acabam por sofrer modificações em seus códigos. Pois filhos e filhas de santo estão também mergulhados (as) em processos sociais da própria cidade, nem todos poderão ter a disponibilidade de se iniciarem como deseja o Nkisi, alguns terão o tempo de iniciação abreviado devido à pressão de compromissos externos, sobretudo pelo mundo do trabalho. Outros terão que adiar iniciação ou obrigação devido ao mesmo motivo. Outros ainda só poderão estar presentes no terreiro em datas de feriado nacional ou no período de férias. Isso fez com que alguns códigos dos terreiros se flexibilizassem para abrigar os seus filhos (as), contudo, sem perder sua natureza tradicional.

Esse é um dos desafios que o Nzo Tumbansi enfrenta junto a outras comunidades tradicionais de terreiro: manter suas tradições dentro de uma perspectiva consumista da modernidade urbana, sua autonomia diante dos processos formais de desenvolvimento urbano e, mais que tudo, manter sua identidade frente os bombardeamentos midiáticos que distorcem milhares de mentes e dos quais nossos filhos e filhas às vezes não estão imunes.

VISITA A IPIAÚ

Ao final do evento, Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi seguiu para a região do médio vale Rio das Contas, desembarcando na cidade de Ipiaú, terra onde viveu e iniciou sua carreira sócio cultural, educacional e tradicional. Nesta localidade participou de várias discussões politicas e culturais foram entrevistado no programa Café com noticias, na Rádio Livre 105, FM, apresentado pelo jornalista e radialista Deraldo Cerqueira, e participou do programa Fala Ipiaú! na Rádio Educadora de Ipiaú, AM 1480 sendo entrevistado pelo radialista Celso Hummel. Em seguida foi recebido em almoço oferecido pelo empresário Cezário Costa, candidato a prefeito do município e que contou com a participação de diversas e variadas lideranças politicas locais.

TERREIRO MATAMBA TOMBENCY NETO

Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi (Walmir Damasceno) e Mam`etu Nkisi Mukalê (Mãe Hilsa Rodrigues) sacerdotisa do centenário Terreiro Matamba Tombency Neto, de Ilhéus, sul da Bahia.

Após permanecer uma semana em visita oficial ao município de Ipiaú, Barra do Rocha, Jequié, Itagibá, Ibirataia, Jitaúna e Aiquara, o presidente do conselho diretor do Instituto Latino Americano de Tradições Afro Bantu – ILABANTU, entidade conservadora e mantenedora do Nzo Tumbansi, Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi – Walmir Damasceno, rumou para as cidades de Itabuna e Ilhéus.

Na cidade histórica de Ilhéus localidade retratada em muitas obras literárias de Jorge Amado, foi recebido pela professora doutora Marlúcia Mendes, coordenadora do curso de comunicação da Universidade Estadual de Santa (UESC), com quem se reuniu com a finalidade de iniciar a construção do projeto “O Brasil tem a alma bantu” que visa produzir um curta metragem, documentário histórico e literário sobre a marcante presença bantu no Brasil.

Durante a visita a cidade de Ilhéus Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi, acompanhado da professora doutora Marlúcia Mendes, foi recebido em jantar oferecido pela Néngwa Kwa Nkisi Mukalê, a carismática Mãe Hilsa, sacerdotisa do centenário Terreiro Matamba Tombency Neto.

Na ocasião, o importante líder e filho carnal de Mãe Hilsa, Marinho Rodrigues, que é Taata do Terreiro Matamba Tombency Neto, convidou Katuvanjesi para proferir uma fala em um evento no dia seguinte, o que aconteceu na presença de diversas e variadas lideranças de comunidades de terreiros, ativistas do movimento negro e do ex-prefeito de Ilhéus, Jabes Ribeiro.

Em sua fala, Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi, emocionado pelo seu reencontro com a família Tombency Neto, aproveitou para enfatizar o valor e importância da comunidade tradicional de terreiro dirigida e liderada por mãe Hilsa Mukalê saudando os demais lideres e integrantes do Terreiro, a exemplo de Taata Kajiongongo, com conversou por muito tempo sobre preocupações mutua no que se refere à preservação dos valores ancestrais das africanidadesbantu no Brasil.

Ao encerrar a visita ao Terreiro Matamba Tombency Neto, taata Katuvanjesi recebeu das mãos de mãe Hilsa Mukalê o seu recém-lançado trabalho literário, o livro Do Outro Lado do Tempo, que se traduz em importante e significativa história da sua vivência e saberes ancestral.

RETORNO DE ILHÉUS A SALVADOR

Da região cacaueira sul da Bahia, taata Katuvanjesi retornou a Salvador. Na capital baiana, foi empossado Coordenador da Federação Nacional do Culto Afro Brasileiro (Fenacab, ex-Febacab, Bahia), em conduzido pelo presidente da entidade, babalorisá Aristides Mascarenhas, de Ajagunã.

Na mesma ocasião, Katuvanjesi foi recebido na sede da Associação Cultural de Preservação do Patrimônio Bantu (Acbantu), Taata Lubitu Konmannanjy, sendo indicado por este Coordenador da importante instituição de preservação do patrimônio bantu para o estado de São Paulo.

Cumprindo uma intensa agenda de atividades politicas, culturais e acadêmicas, Taata Kwa Nkisi Katuvanjesi, seguiu para o Terreiro Tumbenci de Maria Neném, sendo recebido pela sacerdotisa máxima da comunidade, Néngwa kwa Nkisi Lembamuxi, permanecendo neste por vários dias passando por obrigações religiosas.

No dia 22 de setembro de 2012 o sacerdote embarcou para São Paulo sendo recebido no aeroporto internacional de São Paulo-Guarulhos pela Koota Kitamazi Nganga, a médica Eunice R. Bernardes, e rumou em comitiva para o Nzo Tumbansi Tua Nzaambi Ngana Kavungu, em Itapecerica da Serra, onde filhos e filhas de santo já aguardavam em um lauto jantar.