Ekédi Capitã Thaís Trindade d`Ogun e Capitã Elma Pimentel são homenageadas no Inzo Tumbansi

Ekédi Capitã Thaís Trindade d`Ogun e Capitã Elma Pimentel são homenageadas no Inzo Tumbansi

Ekédi Capitã Thaís Trindade d`Ogun e Capitã Elma Pimentel são homenageadas no Inzo Tumbansi

por Joyce Viana.

Saudações ancestrais e tradicionais à terra de Tatetu Kavungu, Inzo Tumbansi. Makuiu Tatetu Nkosi, Makuiu Tatetu Kavungu, Makuiu Tata Katuvanjesi, Makuiu à toda família Tumbansi. 

No dia 6 de Julho, em nosso grandioso terreiro-quilombo Inzo Tumbansi zelado por Tata Katuvanjesi, a Festa Tradicional de Nkosi foi celebrada. 

Tatetu Nkosi, nosso ancestral de luta, nos ensina por meio da voz e das mãos de Tata Katuvanjesi que todos os nossos movimentos devem ser em direção a libertação da nossa comunidade negra africana diaspórica; e que aquelas e aqueles que estão nesse caminhar devem e serão reconhecidos e homenageados em território sagrado. Vale pontuar que o nosso sagrado africano nesta terra só existe por meio da luta, da resistência dos caminhos trilhados por nossos antepassados. Se verdadeiramente acreditamos que somos a continuidade deles, devemos entender que como continuidade temos responsabilidades nesse caminhar. 

Sendo assim, no solo sagrado e quilombista do Inzo Tumbansi, as guerreiras de Nkosi foram homenageadas: Ekédi Capitã Thaís Trindade d`Ogun, coordenadora do Núcleo de Religiões da Polícia Militar do Estado da Bahia(Nafro-PMBA) e a Capitã Elma Pimentel, coordenadora do Centro de Valorização da Mulher Maria Felipa, da PMBA. 

Nkosi — escrevo a seguir com as minhas palavras — bradou por meio de sua filha Ekédi Capitã Thaís Trindade d`Ogun uma grande lição: nós não devemos esquecer quem nós somos independentemente das terras que andamos, devemos ser e construir a continuidade nos princípios do nosso candomblé sem titubear, sem bancar o esquecido, independente da pressão dos territórios que estejamos; porque, na minha visão, Nkosi é o mesmo em todo território. 

Nkosi também bradou por meio da Capitão Elma Pimentel ao afirmar que independente de sermos ou não da religião de matriz africana, o candomblé em si é a ação de lutarmos contra a violência — combate que a Capitã realiza no quesito da violência contra a mulher. 

Além das homenagens e reconhecimentos, Tatetu Nkosi, nosso ancestral civilizador, trouxe para a sua celebração o ambiente para as proposições políticas, com isso convocou para dentro do território sagrado, duas vozes de mulheres negras do território paulista (Vereadora Luana Alves, PSOL/SP e da Ana Laura Cardoso Oliveira co-deputada do mandato coletivo Monica Seixas, do movimento pretas, na Alesp) para evocar os seus compromissos, objetivos, estratégias de luta diante de sua ancestralidade e diante de todos nós — comunidade paulistana e de outras terras. Sentimos cada palavra sobre como se pretende traçar a luta contra o racismo religioso e contra o genocídio do nosso povo africano diaspórico. Acredito que em tempos antigos o nosso povo criava estratégias políticas em conjunto e na presença do ancestral, prática que Tatetu Nkosi retomou em sua festa na terra de Kavungu.

Assim, fica consolidado como os nossos ancestrais estão para além das nossas individualidades, nossos pedidos particulares, nossas obrigações, e principalmente, para além da noção de uma festa contemplativa. Celebração sagrada, Festa de Nkisi também é momento de proposições e de alianças de luta, por isso devemos defender e internalizar a noção do candomblé como uma ciência, um aporte cultural de luta da comunidade negra africana diaspórica.

Digo também é, pois Tatetu Nkosi, além de toda a proposição e homenagem, nos ensinou sobre o que realmente é ancestralidade e como ela é um importante pilar na nossa comunidade africana, e como a ancestralidade se tece trançando intimidade com comunidade. Nkosi, depois de toda a movimentação política, abraçou, trançou cada um de nós nele, um gesto fortalecedor principalmente para quem vive tempos de guerra, sejam guerras internas, sejam guerras frente a comunidade, sejam as duas coisas concomitantemente. 

Nkosi fez questão de abraçar cada um de nós e de deixar a sua guia com cada um de nós, como quem diz onde você estiver, eu estarei. Recebemos a arma do nosso guerreiro ancestral, porque nesses territórios que andamos onde a cada 2 horas uma mulher é assassinada, a cada 23 minutos os nossos filhos, maridos, companheiros, irmãos negros são mortos, em territórios onde os nossos ancestrais são taxados de selvagens, só mesmo Nkosi por nós para permanecermos em movimento de luta. 

O abraço com o ancestral foi um momento de emoção, choramos, rimos na presença dele ao mesmo tempo que me soou como uma preparação para esta guerra…

Nkosi ficou conosco até o final da celebração, o ancestral em toda a sua humildade e em toda a sua simplicidade, pegou de dentro da cozinha a comida regada com o seu poder para nos alimentar. Nos alimentar com o seu ferro, para que a gente tenha por dentro dos nossos ossos, órgãos vitais, do nosso próprio sangue a sua armadura, o seu fundamento para vencermos esse sistema racista que nos esfola por dentro e por fora. Nkosi nos alimentou em todos os sentidos, e não foi embora, longe disso, até mesmo ajudou a servir a comunidade. Vejam, como o ancestral nos ensina no detalhe. 

— O senhor já quer ir embora? 
Nkosi balança o rosto, como quem diz — Não! 

A celebração também foi marcada pela alegria de Tatetu Nkosi, Tatetu Hongolo e Mametu Matamba que comemoravam conosco os anos assentados no mutue de seus filhos. 

A celebração de Nkosi me deixou com as seguintes reflexões: qual foi a última vez que me disponibilizei para quem eu amo? Quando foi o último abraço fortalecedor? Quando foi a última homenagem? Eu entendo a ancestralidade como parte da minha intimidade, que abraça, que é viva, que vive no outro? Quantos de nós entendemos, vemos a ancestralidade como presença imprescindível nas nossas movimentações políticas, de luta? Quantos de nós acendemos a vela para falar de política? Quantas vezes chamei Nkosi para pensar sobre política? Para dialogar sobre soluções? Quantos de nós vemos a ancestralidade como parte indissociável da comunidade e de nós mesmos? Ou só acendo as velas quando penso em meus conflitos e soluções individuais? 

Que Zambi abençoe ao Inzo Tumbansi e a toda a sua família. 

Joyce Viana.